Aleac realiza sessão solene alusiva à Semana de Combate à Hanseníase no Estado

Atendendo ao requerimento n° 104/2019, de autoria da deputada Maria Antônia (PROS), aconteceu na manhã desta quinta-feira (26), no plenário da Assembleia Legislativa do Acre (Aleac), uma sessão solene alusiva à 5° Edição da Semana de Combate à Hanseníase no Estado. Membros do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan) deram depoimentos sobre as situações a que foram expostos por serem portadores da doença.
O Brasil ocupa, hoje, o segundo lugar no ranking mundial em número de casos de hanseníase, ficando atrás apenas da Índia. Conseguiu-se a redução da taxa de prevalência e o aumento de casos tratados com a medicação específica, porém, apesar dos esforços, a meta de eliminação para o país ainda não foi atingida.

Dentre os fatores que impediram alcançar a meta estão a permanência de casos não diagnosticados e a prevalência oculta, condições responsáveis pela manutenção de fontes de contágio na população. No Acre, cerca de 650 pessoas acometidas pela doença foram levadas para o isolamento compulsório até o ano de 1986, outras 150 viveram em isolamento domiciliar. Cerca de mil filhos foram separados bruscamente de seus pais.
A Lei n° 3.407/2018, de autoria da deputada Maria Antônia, faz parte de um projeto reivindicado pelo movimento que reconhece a prática de isolamento e internação compulsória de pessoas atingidas pela hanseníase até dezembro de 1986. Várias pessoas passaram pelo confinamento, sendo afastadas do convívio de seus familiares, algumas não sobreviveram. Membros do Mohan pedem agora que o governador Gladson Cameli (PP) regulamente a lei, que já foi sancionada pelo Poder Legislativo Acreano.
“Agradeço a Deus por este momento ímpar, por estar aqui hoje e poder ouvir estas pessoas tão especiais. O sofrimento passado por muitos deles nos causa uma tristeza profunda, mas a reparação por todo mal a eles causado é o que nos move. Há 11 anos tenho uma parceria com o Mohan, convivo com estas pessoas guerreiras e incansáveis. Tenho certeza que o governador vai olhar com carinho para esta causa, para que eles sejam reconhecidos e apoiados por este governo, pois eles merecem”, disse.
O secretário de comunicação do Mohan no Acre, Bil Souza, destacou as ações do Movimento para reparar os danos sofridos por pessoas que foram diagnosticadas com a doença e obrigadas a ficarem isoladas de suas famílias. A prática do isolamento que era imposta pelo governo, na época, foi realizada até o ano de 1986.

“A sociedade acreana sabe como as pessoas atingidas pela hanseníase foram levadas para o isolamento. Elas eram orientadas a não virem para a cidade, ficavam afastadas de suas famílias. Era um isolamento compulsório. Pais foram separados de filhos, famílias foram desfeitas, vidas foram destruídas. O que buscamos hoje é o reconhecimento e devida reparação a essas pessoas, pois o Estado errou gravemente com elas”, ajuizou.
O promotor Gláucio Ney Shiroma, que participou do ato solene representando o Ministério Público do Estado, afirmou que a Instituição tem trabalhado em conjunto com o Mohan, para que ocorra o reconhecimento e restabelecimento do direito dos acometidos pela hanseníase que foram obrigados a viver no isolamento.
“É importante falarmos sobre a conscientização acerca da hanseníase, pois o preconceito ainda é um tabu a ser quebrado. O Ministério Público tem trabalhado a fim de trazer uma luz sobre tudo que envolve a doença e o reconhecimento dos direitos dessas pessoas. O Brasil, o Acre, têm uma dívida enorme com os acometidos pela hanseníase, uma vez que houve a violação dos direitos humanos cometida por uma política pública segregacionista onde se determinava o isolamento dessas pessoas. Os relatos de separação são tão verazes, que não nos deixam esquecer o sofrimento passado por eles”.
O senhor João Pereira, um dos acometidos pela hanseníase e que foi obrigado a viver no isolamento dos 9 aos 18 anos fez um depoimento emocionado sobre as dificuldades que enfrentou na época. Ele relata que só podia sair da mata onde vivia para tomar banho, após às 22h, quando não tinha mais ninguém por perto, e quando era visto, jogavam-lhe pedras e lhes proferiam os mais diversos insultos.

“Passamos por todo tipo de humilhação. Eu só tinha nove anos quando três policiais chegaram à casa da minha mãe dizendo que eu não poderia mais viver lá. Mandaram ela construir uma casinha no meio da mata e a impediram de chegar perto de mim. Eu era só uma criança e chorei muito quando fui afastado dela e dos meus irmãos. Até meus 18 anos vivi sozinho na mata. Quando eu saía tarde da noite para tomar banho, as pessoas jogavam pedras em mim, me xingavam e eu tinha que voltar chorando”, disse emocionado.
João Pereira disse que o grupo atingido pela hanseníase e que foi submetido ao isolamento, só quer que seus direitos sejam reparados pelo Estado. Ele alega que as memórias tristes que acumulou ao longo desse tempo jamais poderão ser apagadas, mas que até mesmo pela memória daqueles que já faleceram sem ser reparados pelo que foram obrigados a passar, se faz necessário que o governo do Estado regulamente a Lei n° 3.407/2028.
O que disseram os parlamentares:
José Bestene (PP)
“Parabéns, deputada Maria Antônia, por ser propositora dessa sessão tão importante. Essa é uma causa que diz respeito a todos nós. Ouvir o depoimento dessas pessoas nos entristece. É difícil se afastar dos pais, dos filhos, uma situação como essa sensibiliza todos nós. Sempre abracei esta causa, pois sei que eles precisam ser reparados diante de tudo a que foram submetidos. ”
Edvaldo Magalhães (PCdoB)
“Inicio minha fala recordando dois grandes líderes que fizeram parte do início da minha vida como sindicalista, o Bacurau e o Celso Lima, que foram alguns dos organizadores da volta dos hansenianos do isolamento. Este é um tema importante. Se alguém escrevesse a história de cada uma dessas pessoas, as dores e superações, teríamos uma biblioteca, porque cada relato nos causa um impacto diferente. O reconhecimento e reparo por tudo a que foram obrigados a viver é algo essencial para todos os atingidos.”
Doutora Juliana (PRB)
“Esta é uma justa homenagem e eu parabenizo a deputada Maria Antônia pelo formato desta sessão solene, onde tivemos a oportunidade de debater sobre esse tema tão relevante. Não vejo a continuidade desse caminho senão quebrarmos a barreira do preconceito, pois ela sim impede que as demais causas sejam conquistadas. ”
Jenilson Leite (PSB)
“Trazer este tema para ser debatido numa sessão solene é oferecer uma luz à discussão sobre esta causa tão importante. Nós nos somamos a luta que vocês estão trazendo aqui hoje. Estive na Casa Souza Araújo, sabemos dos problemas que o local está passando para atender pacientes. Isso demonstra o quanto necessitamos ajudar essas pessoas, não só pelo que elas já viveram, mas também pelo que continuam vivendo.”
Diagnóstico e tratamento da hanseníase
O diagnóstico da hanseníase é clínico e epidemiológico, realizado por meio do exame geral e dermatoneurológico para identificar lesões ou áreas de pele com alteração de sensibilidade e/ou comprometimento de nervos periféricos, com alterações sensitivas e/ou motoras e/ou autonômicas.
Como sintomas, a doença pode apresentar:
· Manchas hipocrômicas e esbranquiçadas, avermelhadas ou amarronzadas, em qualquer região do corpo, apresentando perda ou alteração de sensibilidade térmica (ao calor e frio), tátil (ao tato) e à dor, que podem estar principalmente nas extremidades dos membros superiores e inferiores, na face, nas orelhas, no tronco, nas nádegas e nas pernas;
· Áreas com redução dos pelos e do suor;
· Dor e sensação de choque, formigamento, fisgadas e agulhadas ao longo dos nervos dos braços e das pernas;
· Edema de mãos e pés;
· Redução da sensibilidade e/ou da força muscular da face, mãos e pés, devido à inflamação de nervos, que nesses casos podem estar engrossados e doloridos;
· Úlceras de pernas e pés;
· Nódulos, em alguns podendo estar avermelhados e dolorosos;
· Juntas apresentando febre, edemas e dor;
· Entupimento, sangramento, ferida e ressecamento do nariz;
· Olhos ressecados.

A informação sobre a manifestação clínica da hanseníase em cada pessoa, é fundamental para determinar a classificação operacional da doença como Paucibacilar (poucos bacilos) ou Multibacilar (muitos bacilos), e para selecionar o esquema de tratamento adequado para cada caso.
O Sistema Único de Saúde (SUS) disponibiliza o tratamento e acompanhamento da doença em unidades básicas de saúde e em referências. O tratamento da doença é realizado com a Poliquimioterapia (PQT), uma associação de antimicrobianos, recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Essa associação diminui a resistência medicamentosa do bacilo.
Os medicamentos são seguros e eficazes. Ainda no início do tratamento, a doença deixa de ser transmitida. Quanto antes a pessoa iniciar o tratamento, menores são as chances de surgirem incapacidades físicas, além de favorecer a interrupção da cadeia de transmissão.
Texto: Andressa Oliveira
Revisão: Suzame Freitas
Fotos: João Simão
Agência Aleac